segunda-feira, 1 de outubro de 2012

O livro do mês...

    Esta é a nossa sugestão de leitura recreativa. E nada melhor que a leitura do prefácio de João de Barros, para iniciarmos mais esta viagem...


    O autor desta quase literal adaptação de Os Lusíadas
reconhece — apesar do respeito, do cuidado e do carinho
que pôs na delicadíssima tarefa — que ela é de qualquer
modo sacrílega.
    Não se toca numa obra de génio, para a apresentar sim-
plificada aos olhos do público, sem a triste e aliás inevitável
sensação de amarfanhar a sua beleza, de corromper e des-
folhar o seu encanto radioso.
    Não me pejo de confessar que estive constantemente
angustiado, que sofri contínuos e sérios remorsos, enquanto
procurava interpretar, em prosa corrente e fácil, a grandeza,
a majestade épica de Os Lusíadas.
    Insisti e teimei em fazê-lo, não por gosto e deleite no
trabalho, mas porque este me pareceu necessário, urgente
e — perdoe-se-me o orgulho — sinceramente patriótico.
É costume dizer-se que Os Lusíadas são a Bíblia da Pátria,
ou, menos retoricamente, o livro nacional por excelência.
De facto. Mas essa Bíblia, esse livro intrinsecamente nacio-
nal, só tomam contacto com ele — quando o tomam... — os
alunos dos liceus, a partir do meio do seu curso, e os adultos.

As crianças não o leem, não o podem ler — as crianças
que, por muito pouco que entendam o francês, encontram
nessa língua edições, à sua escala e medida, da própria
    A Odisseia, não será tempo de oferecer-lhes uma singela,
embora imperfeita adaptação da nossa Odisseia — Odis-
seia real, e não apenas imaginária, e, mesmo por isso, mais
do que a outra maravilhosa — para que ao menos se lhes
tornem familiares o povo, os heróis, os acontecimentos no-
táveis e celebrados por Luís de Camões e que são glória
imorredoira da nossa terra?
    Creio que sim. E foi para elas — pensando na alegria
de ajudar a criar nas almas infantis o civismo de que tanto
falamos e de que tanto carecemos — que me atrevi a redu-
zir a linhas essenciais, embora pobres, a linhas acessíveis
à mais ingénua visão, a opulência de arquitetura, a prodi-
giosa riqueza de emoções, de sentimentos, de imagens e
de ideias, que, página a página, cativam e deslumbram o
leitor de Os Lusíadas.
    Ousarei ainda acrescentar que esta adaptação a con-
sagro também — ao Povo. Não que o Povo — que somos
todos nós — ignore o poema, a sua celebridade e a sua
inspiração. Mas esquece talvez demais as nobres ligações
que dele dimanam. Atrevo-me a supor que ninguém levará
a mal que eu tão francamente o diga — e que ninguém dei-
xará de perdoar, pela pureza da intenção, os erros e faltas
da minha modesta e receosa tentativa.
                                                               João de Barros



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